Capítulo II
Riacho
15 de Março de 2011
Acordei, ainda sentia meu corpo pesado, mas não estava mais amarrado. Não estava mais com fome e nem sede. Estava confortavelmente deitado numa cama de hospital. Estava nu. Na verdade usando uma daquelas vestes horríveis de hospitais. Tinha alguém ao lado da minha cama. Abri os meus olhos semicerrados e contemplei a beleza daquela moça.
- Não sabia que os anjos eram tão lindos assim...
Ela sorriu gentilmente. E mostrou um anel de compromisso na mão direita. Preparou a injeção e solicitou que eu cedesse o braço esquerdo. Eu cedi.
- Você é comprometida e eu sou... Bem, não iria dar certo, não é?
Ela riu novamente. Aplicou a agulha em minha veia. Senti uma dor aguda e sutil quando objeto penetrou minha carne. Sorri pra ela. Ela colocou um pedaço de algodão no pequeno ferimento que a agulha tinha me feito.
- Podemos tentar se você quiser. Seu namorado nem precisaria saber...
Ela sorriu mais uma vez, me olhando gentilmente, sem dizer nenhuma palavra. Retirou o algodão e o jogou no lixo. Peguei sua mão livre antes que ela se afastasse. Perguntei seu nome; ela apenas olhou pra mim e disse “bons sonhos” e depois se retirou do quarto.
Admirando a porta por onde aquela mulher linda havia saído, adormeci outra vez...
Mantinha a mesma rotina de passar a maior parte do tempo imerso na imensidão de mim mesmo. Nos poucos momentos que permitiam voltar à vida, lembrava-me de estar junto daquela mulher linda, que vinha sempre me medicar. Ela era de poucas palavras e muitos sorrisos. Admirava isso nela. E admirava ainda mais a sua beleza.
Por meados do final daquele primeiro mês, me permitiram sair de meu leito e caminhar pelos arredores daquele lugar. Sentia meu corpo insuportavelmente instável. A impressão que tive era que logo levaria toda minha massa corpórea ao chão. Senti o sol queimar minha pele, mesmo que fosse morno e agradável como a maioria dos dias ao entardecer. Explorei o local, que era verde, com muitas plantas, com um lindo gramado, com muitas flores, como um jardim extenso, sem fim. A esmo andei, quando avistei um pequeno riacho. De uma pedra colossal jorrava uma cachoeira. Precisava por os pés na água. Estava descalço, roupas leves e claras. Na beira do riacho, pus os pés na água. Se antes queimava com o sol morno, agora congelava na água gelada. Estava sensível. Ainda assim, gostei da sensação de sentir a parte interna do meu corpo sentir frio.
Caminhei riacho abaixo, pela beirada; as pedras massageando meus pés. Senti novamente uma instabilidade insuportável. Dessa vez viera como uma debilidade. Ao próximo passo, senti minhas pernas e pés cederem. Meu pé pisou na pedra, que agora era como sabão: escorregadio e traiçoeiro. Lentamente tombei, sentindo uma dor aguda e bem breve no meu crânio. Do jeito que repousei com ímpeto ao solo, fiquei. Olhei a água correr riacho abaixo, até que senti minha cabeça úmida, meus olhos pesando. Sem medicamentos e injeções, dessa vez, fui lançado ao âmago de meu ser...
Música Tema: Riverside - Agnes Obel
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Cristian Chocolath